Placas e produços de aço correspondem a 75% do que foi exportado aos Estados Unidos pelo Ceará em 2025 - Foto: Camila Lima/Diário do Nordeste
Mais de 90% das exportações do Ceará aos EUA seguem com tarifa de 50%; veja itens afetados
A maioria (92%) dos produtos exportados pelo Ceará para os Estados Unidos será tarifada em 50%, com a sobretaxa oficializada por Donald Trump, que deve entrar em vigor em 7 de agosto.
Quase todo o valor exportado no primeiro semestre de 2025 corresponde a produtos que foram sobretaxados em 40%. Isso, somado à tarifa padrão de 10% anunciada em abril, resulta em uma tarifa de 50% para a entrada dos produtos brasileiros nos EUA.
O governo estado-unidense deixou de fora cerca de 700 itens da cobrança extra, como suco de laranja, veículos, aeronaves, fertilizantes e produtos de madeira. Embora o ferro e o aço também tenham sido poupados da nova sobretaxa, esses produtos já estavam tributados em 50%, desde que uma decisão geral sobre o setor entrou em vigor em junho.
Assim, pode-se afirmar que, com base na taxação atual aplicada ao segmento siderúrgico, os principais itens exportados pelo Ceará, ferro e aço, continuam sujeitos a uma tarifa de 50%, o que faz com que 92,11% de toda a produção exportada pelo Estado seja impactada por essa alta tributação.
Sozinha, a exportação de ferro, aço e seus semimanufaturados correspondeu a 75% do total enviado aos Estados Unidos em 2024, totalizando US$ 417 milhões, conforme dados do Comex Stat, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços.
Além do ferro e do aço, outros produtos bastante exportados pelo Ceará e sujeitos à tarifa de 50% incluem pescados, frutas, ceras vegetais (como a cera de carnaúba), calçados, couros e peles inteiras, mel e lagostas. Juntos, esses itens representam 16,11% das demais pautas exportadoras do Estado.
Medida impacta fortemente o mercado de trabalho cearense
A diminuição de demanda nos mais diversos setores pode ter reflexos no mercado de trabalho, com demissões e perda de renda de produtores independentes. O economista Alex Araújo aponta que os efeitos podem ser imediatos, a partir de cancelamento de contratos por importadores norte-americanos.
“Como resposta inicial, as empresas tendem a adotar medidas de ajuste temporário, como férias coletivas e renegociações com os trabalhadores, evitando, num primeiro momento, demissões em massa”, aponta.
O impacto deve ser sentido de forma desigual entre os setores, atingindo de forma mais severa aqueles mais dependentes da exportação para os Estados Unidos.
Peças de carros estão isentas, mas há indefinição sobre a castanha de caju
Entre os produtos isentos da sobretaxa que têm exportação significativa no Ceará, estão as peças destinadas a veículos de passageiros, que totalizaram US$ 4,9 milhões nos primeiros seis meses.
Há uma incerteza em relação à castanha de caju, que está entre os 10 itens com maior valor de exportação aos Estados Unidos. A lista de exceções divulgada pelo governo norte-americano isenta da sobretaxa somente as 'brazilian nuts', termo para usado a castanha-do-pará.
O documento aponta, entretanto, que todos os produtos na classificação 8 da Tabela Tarifária Harmonizada dos Estados Unidos não são atingidos pela sobretaxa, o que incluiria a castanha de caju e outros itens similares.
A lista de tarifações está sofrendo alterações, sem concordância com lógicas comerciais, aponta Larissa Amaral, professora de Comércio Exterior da Unifor. A especialista afirma que há abertura para que o setor de castanha de caju tente exportar sem a tarifa extra.
“As ordens executivas dizem que existe deficit comercial, mas não existe. Diz que vão ser reduzidas as tarifas do que não é produzido nos Estados Unidos, mas isso também não está sendo seguido. A lógica não está sendo seguida, então temos que acompanhar”, aponta.
Isenções beneficiam mais outros estados do que o Ceará
Parte das isenções anunciadas alivia diversos setores da produção brasileira, mas que não têm produção significativa ou vocação exportadora no Ceará.
O cenário é ainda mais alarmante, já que os Estados Unidos representam o maior mercado exportador cearense, destaca o professor Ricardo Eleutério, conselheiro do Conselho Regional de Economia (Corecon-Ce).
Cerca de metade das mercadorias enviada ao exterior no primeiro semestre teve como destino os Estados Unidos. Mesmo com a oficialização dos produtos, o Ceará segue como o mais impactado pela medida.
“É um desafio bastante grande. Todavia, vale salientar que as negociações estão ainda em curso e permanecerão em curso por algum tempo. A dificuldade do Brasil e dos estados brasileiros reside em um elemento político, não é só um conflito comercial”, aponta.
Por que as exportações são importantes para a economia do Ceará
A exportação tem um papel estratégico no desenvolvimento econômico do Ceará, destaca Alex Araújo. A atividade contribui diretamente para a modernização da estrutura produtiva e aumento da competitividade dos setores locais.
“No caso específico do Ceará, a exportação é particularmente importante por seu papel na dinamização de setores-chave, como fruticultura, calçados, têxtil, pescados e pedras ornamentais. Esses segmentos não apenas geram receitas em moeda estrangeira, como também sustentam milhares de empregos”, lista.
O economista ressalta que a situação exigirá medidas de mitigação para evitar um colapso no setor exportador. Os governos federal e estadual ainda não divulgaram oficialmente o plano de ação para apoiar os setores afetados.
O governador do Ceará, Elmano de Freitas, analisa comprar peixes e castanha de caju para a alimentação de escolas e hospitais públicos. Em nível federal, o apoio pode ser realizado com recursos do Fundo de Desenvolvimento Industrial.
A longo prazo, a recuperação dos setores envolve ampliação das vendas para o mercado interno ou exportação para outros países consumidores. Conquistar novos mercados de forma urgente pode ser um desafio, segundo a avaliação do economista Ricardo Eleutério.
“Conquistar mercados internacionais, mudar destinos exportados, isso envolve todo um processo de negociação, logística, financiamento. Também envolve elementos culturais, a depender do consumo de outros países”, ressalta.
(Diário do Nordeste, por Mariana Lemos)